A fundação da igreja do Espírito Santo remontará, provavelmente, a finais do século XIII ou a inícios do século XIV, épocas em que o culto ao Paracleto adquire um forte impulso, de norte a sul do país. Sediou-se na aldeia dos Crespos, antropónimo que, como tantos outros do termo de Mértola, se reporia à presença de senhores terra-tenentes que localmente alcançaram importância e prestígio social após a Reconquista. A partir de finais do século XVI, porém, a primitiva designação da aldeia cai em desuso, embora a linhagem dos Crespos se tivesse mantido muito para além desta centúria.

Como os demais templos de Mértola que recuam as suas origens à época medievais, ergueu-se sem a prévia autorização da Ordem de Santiago, situação de que dá conta, em 1452, um seu visitador:

«achamos quem na edeficou nom tijnha liçemça do mestre nem agora nom na tem»

De acordo com a informação constante num processo visitacional de 1515, o templo fora reedificado pelos freguesias havia «cinquoento e dous annos pouco mais ou menos», isto é, por volta do ano de 1473. Era de uma só nave e capela-mor saliente, ambas de dimensões razoáveis, e apresentava-se em boas condições. O seu recheio pode considerar-se apreciável quando comparado, a altura, com a maioria dos templos paroquiais vizinhos. Os altares e as imagens de vulto que possuía atestar essa realidade.

No  altar da ousia, em que se destacava uma pintura mural com a «jmagem do esprito santo», mostravam-se várias «outras de vulto», desconhecendo-se, contudo, a que cultos estavam dedicadas. Os dois altares que se erguiam nas «paredes do cruzeiro», ambos de «pedra e barro», consagrados a «santo antonjo» e a «sam matyas», exibiam «jmagens de Vulto» dos seus padroeiros. Nas paredes da nave, figurando os restantes cultos do imaginário local, desdobravam-se, por sua vez, «mujtas pinturas de santos», numa composição cenográfica que não deixaria de impressionar os fiéis.

Até 1554, a julgar pela descrição dos visitadores que se seguiram, a única novidade a registar é a introdução, no altar-mor, de um «Retauallo meão do esprito santo de boas pynturas com hum guarda poo pequeno com huas estrellas douradas». Contudo, a estabilidade que o templo conheceu até meados do século XVI, nas estruturas edificadas e na organização do seu espaço interior, não se prolongaria muito mais no tempo.

No ano de 1565 estava em curso a construção de uma novo igreja, no mesmo local, tendo-se procedido ao derrube parcial do antigo templo. Deste conservou-se «somente a capela», para que se continuasse a oficiar missa enquanto durassem as obras. No seu altar, encontravam-se expostas umas «jmagens de vulto muyto velhas» bem como «hum Retavolo pequeno da estoria do espírito santo». Os altares de St.° António e S. Matias tinham sido, entretanto, desmantelados. As imagens de culto destes santos, vieram posteriormente a desaparecer, assim como desapareceriam as demais que se achavam colocadas, na altura, no altar da capela-mor.

Desconhece-se a causa imediata que esteve subjacente à decisão de mandar derrubar a primitiva igreja da paróquia. O seu possível mau estado de conservação e a vontade dos fregueses de erguer um edifício mais amplo e de nova arquitectura, melhor adaptado às necessidades quotidianas de organização do culto e de acolhimento de uma população que estava em crescimento, terão sido as principais razões que estiveram na base de tal empresa. Não podem ser minimizados, por outro lado, os desejos de afirmação social por parte das elites locais, sabida a importância que assumia (e ainda hoje assume) a competição entre paróquias, reflectida na opulência e riqueza dos seus templos.

A nova igreja paroquial encontrava-se, em 1565, em fase inicial de construção. A envergadura do templo, o mais imponente, na época, em todo o termo de Mértola, justificou o prazo concedido pelo visitador para a sua conclusão. De referir, entre as determinações que deixa exaradas para serem cumpridas pelos fregueses, as seguintes: erguer «tres altares com Suas grades pelos piares mais chegados aos altares que tomem de parede a parede»; mandar «fazer hum retavolo conforme ao altar moor pintado a oleos da jnvocação do espyrito Santo» e colocar «nos outros dous altares imagens de vulto da Sua jnvocação».

Ignora-se se os fregueses concluíram as obras no prazo estabelecido ou se se viram obrigados a pagar, pelo seu atraso, a coima prevista de «çinquoenta cruzados». O que importa reter é que a igreja paroquial do Espírito Santo, tal como hoje se observa, foi estruturalmente modelada em finais da década de sessenta do século L’VI, não obstante os pequenos acrescentos e adaptações posteriores.

É um templo amplo, de três naves, divididas por cinco arcos em pleno centro, que descansar em colunas monolíticas rematadas por capitéis de tambor, não decorados. A capela-mor é profunda, com cobertura em abóbada de meia-cana, solução construtiva que não se estendeu às naves, que apresentam um forro de ripado suportado por uma elegante armação de madeira. No topo dos braços do transepto, não desenvolvido, encontram-se duas pequenas capelas de planta quadrangular, cobertas por abóbadas hemisféricas. O baptistério e a sacristia completam o conjunto edificado quinhentista, aquele mostrando uma bem proporcionada abóbada de nervuras, de secção hexagonal, e esta uma abóbada de aresta. É de realçar a diversidade dos sistemas de cobertura presentes no edifício,  obra de anónimos mestres construtores. A torre sineira, ainda que, eventualmente, tenha reaproveitado os alicerces e parte do corpo de uma anterior, aparenta ser de finais do século XVII ou de inícios dos XVIII, sendo provavelmente contemporânea dos trabalhos de recomposição formal da fachada. Dos séculos XIX e XX são as restantes dependências anexas que se desenvolvem ao longo do alçado norte da igreja.

Não se tem conhecimento, uma vez terminadas as obras da igreja, de como se organizou o seu espaço interior. Fica por saber, em particular, quantos altares secundários se ergueram, quais os cultos a que foram consagrados e que imagens de vulto receberam, lacuna histórica difícil de preencher, uma vez que o recheio que se conservou remete para âmbitos culturais e cronológicos posteriores ao da construção do templo.

A memória paroquial de 1758, claramente distante da época histórica em causa, fornece, porém, os elementos básicos para se compreender a evolução registada entre o último quartel de Quinhentos e os finais de Seiscentos, lapso de tempo que corresponderá ao da introdução e sedimentação dos Cultos maiores praticados pelos fregueses.

A primeira conclusão que se impõe, comparando a situação existente em meados do século XVI com a de dois séculos depois, é a de que os altares laterais levantados nas paredes do cruzeiro mudaram de invocação, sucedendo, aos primitivos cultos a St.° António e a S. Matias, duas importantes devoções do universo mariano: N. Sr.ª do Rosário e N. Sr.ª do Carmo. A marianização dos dois altares, que provavelmente se consumou no século XVII (com a possibilidade de, no caso de N. Sr.ª do Rosário, se ter verificado ainda no século XVI), ditou o desaparecimento da devoção a S. Matias e esbateu a prestada a St.° António, muito embora esta se tenha perpetuado até aos nossos dias. A segunda conclusão é a de que se instituíram dois outros altares, ambos no amplo corpo da igreja, provavelmente mais tardios que os anteriores, dedicados ao Menino Jesus e as Santas Almas, cultos que conheceram uma forte aceitação em Seiscentos.

No que toca às imagens de vulto, não se restringiriam, por certo, às que implicitamente são referidas pelo pároco no citado ano de 1758: N. Sr.ª do Rosário, N. Sr.ª do Carmo, Menino Jesus e S. Pedro. No altar das Almas e no altar-mor, ou mesmo nos restantes, encontrar-se-iam outras. Seria o caso, nomeadamente, das imagens de St.° António, S. Luís e S. Sebastião, que ainda hoje se conservam e que manifestamente se integram nas produções tipo de finais do século XVII/inícios do século XVIII. É possível, aliás, se atendermos a que se reportam a cultos extremamente difundidos no termo de Mértola, que tenham substituído, nessa época, antigas imagens já envelhecidas.

De acordo com o inventário republicano do ano de 1912, a igreja paroquial do Espírito Santo possuía doze imagens. Além de dois Cristos Crucificados, um deles classificado como «grande», existiam as de N. Sr.ª do Carmo; N. Sr.ª do Rosário (duas imagens); N. Sr.ª dos Prazeres; N. Sr.ª do Pé da Cruz; Menino Jesus; St.º António; S. Luís; S. Sebastião e uma santa que não identifica (trata-se, provavelmente, da imagem de St.ª Antónia, como assim a denominam os fregueses hoje em dia, monja bejence que despertou um culto regional de contornos pouco claros).

Este conjunto de imagens sobreviveu até ao presente. Ao rol republicano há a acrescentar, ainda, três outras: uma de S. Pedro, um segundo exemplar de S. Luís e uma de S. João Baptista. A primeira, seiscentista, encontrava-se em 1758 no altar das Almas, a segunda foi conduzida em meados deste século, como anteriormente se aludiu, para a igreja paroquial de Corte do Pinto (estranha-se, pois, a omissão de ambas  no  inventário  de 1912) e a terceira, de feitura recente foi, segundo informação oral, «trazida da cidade de Beja».